Os opositores de Bolsonaro

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Jair Messias Bolsonaro tomou posse, numa bela cerimônia em Brasília, acompanhado da primeira dama Michelle Bolsonaro, que numa cena inédita, discursou (em libras) para o público, antes do discurso oficial. Numa quebra de protocolo inusitada, o casal Bolsonaro chegou a protagonizar dois beijos na boca, incentivados pelos populares que assistiam o discurso.

O novo presidente do Brasil fez um discurso emocionado, que repetiu os direcionamentos da campanha que o elegeu democraticamente com o voto de quase 58 milhões de brasileiros: o que ele chama de “combate ao socialismo”, combater o politicamente correto, defender a a propriedade privada, dar protagonismo de investimentos na educação básica, a mudança da lógica que vitimiza os criminosos, a desburocratização do estado e o apreço à liberdade econômica, além de prometer fazer com que o Brasil ocupe o lugar que merece no cenário global, entre outras coisas.

Porém, não quero tratar aqui dos demais acontecimentos da posse e do presidente em si, mas da oposição ao novo governo.

Antes mesmo da posse, nunca vi tanta gente mais pro lado progressista, ou de esquerda assumida mesmo, nos meus meios sociais, cobrando e zombando tanto um governo e seus apoiadores. Muitas pessoas que só cobravam e criticavam até certo ponto, bem tímido, os imundos governos anteriores, para depois defende-los até o talo, estão agora ainda mais loucos de vontade de mudar o mundo, combater discursos, fazer piadas, encontrar hipocrisias e contradições, chamar seus contrários de ignorantes, etc. O que penso sobre isso? Acho ótimo! Esse pessoal fica muito bem na oposição, combina e é bom para todo mundo! Estão no melhor lugar que poderiam!

Nenhuma nação em que seu povo é adepto, ou é induzido pelo uso da força, a comprar por inteiro as ideias politicas de um líder, de um partido, ou de um grupo de interesses, pode prosperar em bases sólidas de democracia. Precisamos de divergência, de possibilidade de alternância e de fiscalização, mesmo que ainda façamos isso de maneira muito infantiloide e supervalorizada no Brasil.

Todo governo precisa de vigilância, de forças que equilibrem e impeçam o apego visceral ao poder, pelo menos até o ponto em que o Estado exerça tão pouca influência que, possamos trata-lo de forma quase que esquecível, mas que ainda assim possua medo de pisar fora da linha e perturbar seu povo. Nenhum governo pode exercer seu poder de maneira absolutamente confortável. O dever do cidadão é muito mais o de desconfiar, do que o de confiar, no Estado e no Governo (seja qual for). Espero que a maioria dos apoiadores de Bolsonaro não caiam no mesmo erro que muitos de seus opositores caíram nos últimos tempos, e que, depois de passada a festa, valorizem com coragem seu próprio senso crítico, para não se transformarem no petismo inverso (lembrando o alerta de Janaina Paschoal).

O ideal seria que cada um de nós, nos comportássemos dessa maneira, como uma célula social incapaz de deixar se dominar pela total insensatez ideológica. O ideal seria que, nenhum de nós, enxergássemos uma vertente politica como uma seita ou uma verdade inquestionável, ou algo que nos confirmasse como adeptos de um “lado certo” para proporcionar orgasmos de vaidade. Que não quiséssemos acreditar em algo até as ultimas consequências, apenas para provar nosso ponto. O ideal seria que tivéssemos o pensamento critico e individual acima de qualquer concepção identitária, coletivista e massificadora. O ideal seria que nós fossemos mais indivíduos ao formar a nossa cultura, até porque as facetas culturais antecedem a politica. O ideal é que parássemos de depositar tanta esperança nos governantes e de nos perguntar o que o Estado pode fazer por nós.

Sei que, infelizmente, é muito difícil exigir esse ideal. Sei que ainda estamos muito distantes disso, e que ainda somos crus como nação. Por isso, mesmo que, não da maneira ideal, e muito distante de um padrão elevado de consideração da palavra “resistência”, muito benéfica é a manifestação dos opositores do novo governo, porque seria benéfica contra qualquer governo. Até porque, também infelizmente, estamos muito distantes de poder viver sem sequer precisarmos nos dar conta que existe uma porcaria de governo, o que seria ainda mais legal.

Uma critica que, qualquer um que não esteja hipnotizado pela bolha progressista de esquerda consegue fazer, com relação aos opositores de Bolsonaro é que, esses opositores, aprenderam muito pouco com seus próprios erros dos últimos anos. Alguns desses erros, inclusive, que trabalharam para eleger Bolsonaro aqui, assim como também ajudaram Donald Trump a se tornar presidente. Coisas essas que, desconectam esses atores das demandas reais das pessoas, do dia a dia, dos anseios e interesses das pessoas comuns.

Tudo isso vem do motor de expor a já banalizada autopropaganda das virtudes, a arrogância intelectual de algumas classes, a hipocrisia dotada de imensa falsa simetria, os ataques de pelanca, defesa de perversos criminosos por um “bem maior”, cagações de regras de patrulheiros do politicamente corretos e evidente falta de moral para cobrar dos outros o que não fizeram até hoje, além de frases tolas repetidas como mantras e que só falam para dentro de sua própria turma, porque só assim receberão aplausos.

Desejo que consigam fazer essa autocritica, porque espero que minhas criticas seja construtivas, mesmo sabendo que me coloco assim, como uma espécie de advogado do diabo, porque espero uma sociedade com confrontos mais respeitáveis. Porém, não acredito que tão cedo essa autocritica seja possível, sendo assim, farei essas criticas, esperando que possam captar algo de útil. Isso também vale para os apoiadores de Bolsonaro, que agora no poder, correm o risco de mergulharem em erros semelhantes.

Repara-se, por exemplo, que a grande maioria dos opositores do novo governo, ainda acredita que, simplesmente o “antipetismo” e o “combate à corrupção”, foram disparados os fatores mais determinantes para o resultado das eleições de 2018. Lógico que foram muito importantes, que provavelmente estão na base da pirâmide (com outros) dos fatores, lógico que o brasileiro não aguentava mais o PT e a corrupção institucionalizada (coisas que se confundem, diga-se de passagem), mas nem de longe se isolam no cenário, acabando por gerar análises que param num campo raso de paixões. Não é possível, enxergar toda a conjuntura dessa história, observando através de um canudo.

Dentro desses, existem os que “condenam” o PT e seus eleitores por não terem dado vez ao Ciro Gomes que, na visão deles, teria mais chances de vencer no segundo turno. Tudo isso acreditando em pesquisas que se mostraram totalmente dispensáveis no fim das contas, e numa veneração do poder intelectual de Ciro. São as mesmas pessoas que desacreditaram e zombaram da possibilidade de Bolsonaro ser eleito, os mesmos que acreditam até hoje que um debate de segundo turno com Haddad, poderia mudar o jogo. O fato é que a eleição de Bolsonaro estava desenhada, e ele só cresceu no decorrer da campanha, onde muitos especialistas diziam que ele ia começar a se desgastar. Bolsonaro sempre foi o protagonista das ultimas eleições, beneficiado, inclusive, por seus opositores. As chances de Ciro tomar esse posto de protagonista seriam mínimas, até porque é muito difícil tirar o foco de cima de uma pessoa, tendo que falar sobre essa pessoa para tentar isso. O fracasso da campanha #elenão, é outro exemplo disso. Bolsonaro já era o protagonista dessas eleições, muito antes que as eleições de fato começassem e, muito tempo antes, que seus opositores o considerassem na disputa.

Ainda mais grave é o fato do grupo em que, alguns, ainda acreditam que os 58 milhões que votaram em Bolsonaro são fascistas (palavra séria que se tornou algo banalizado, sem sentido e até engraçada na maioria das vezes que é usada), pessoas ruins, pessoas que querem ferrar negros, pobres, mulheres e gays (vindo de pessoas que garantem saber o que querem, e o que são obrigados a querer, todos os gays, pobres, mulheres e negros, ou não são legítimos representantes dessas classes). Esses, participantes admiráveis da feira de virtudes. São os seres elevados de nobreza que repetem como papagaios palavras e frases que, também foram banalizadas, como racistas, machistas, homofóbicos e afins, para assim, se posicionarem como as pessoas evoluídas que querem se mostrar ser. Se o outro lado é tão malvado, como alguém poderia não combate-lo? Aqui, o politicamente correto também se faz presente, de maneira violenta, com a exigência de retratação ou a destruição de reputação. Uma das principais características desse grupo de justiceiros sociais, é a seletividade moral. Não importa o que você faz, e sim o lado em que você está! Desse braço, também se encontra o batizado “ódio do bem”!

Nessa parcela de opositores, também estão incluídos, com algumas diferenças de modos, os arrogantes com pose de sábios. O grupo dos que não percebem o quanto são desacreditados e ridicularizados cada vez mais, e continuam falando do alto de seus pedestais. Esse grupo se comporta como alguém que se masturba e sai contando que transou.

Aqui estão alguns jornalistas, intelectuais, artistas, professores doutores e militantes, etc. Pessoas que não só acreditavam que formavam a opinião pública, mas viam isso como uma missão. Essas pessoas que juraram que suas manifestações politicas causariam imensa influência na população, impedindo a eleição de Bolsonaro. Para esses seres que se consideram a ultima bolacha no pacote da intelectualidade, a eleição de Bolsonaro é a prova de que eles fazem parte de um grupo restrito de pensamento, porque a população é burra e completamente alienada, não tendo consciência do erro que cometeram, esses pobres coitados.

Outro curioso grupo de opositores do novo governo é o dos ingênuos selvagens, porque assim os chamo. Esse é grupo que está atento para capturar qualquer coisa que soe como um desvio, ou como uma decisão errada do presidente e dos que o cercam, para jogar na cara dos seus apoiadores, esperando que os que apoiaram Bolsonaro se rendam, se arrependam, digam que estavam errados e que fizeram merda.

Arrependimento, nesse caso, é um fator engraçado. Creio que confundem arrependimento com decepção. Considero uma coisa normal se decepcionar com um governo, mesmo com alguma esperança de me surpreender positivamente, porém, nesse caso (eleições de 2018), arrepender-se traria a premissa de considerar que a outra opção era melhor que a escolhida. Para arrepender-se de ter apoiado Bolsonaro no segundo turno, seria necessário arrepender-se de não eleger Haddad, só para começar. Seria desconsiderar a necessidade de alternância de poder e todas as outras pautas em questão no pleito, além da crença de que a outra opção não cometeria os mesmos eventuais erros, ou piores. E ainda teriam, nesse arrependimento, que não comparar esses erros com os erros dos governos passados. O tipo de pessoa que vai compartilhar o Karnal comparando a compra de CD pirata por um cidadão comum, com a corrupção da classe politica.

Mas não é só por aí que a ingenuidade aparece. O ingênuo é acreditar que a grande massa dos que apoiaram Bolsonaro no segundo turno, se comportam necessariamente como seus opositores, ou seja: que acreditam na santidade de seu candidato, assim como alguns petistas se reportam à Lula. Existem eleitores de Bolsonaro que são assim? Com certeza, assim como existem os que decepcionados com alguma pauta, se dirão arrependidos, mas arrisco dizer que são uma parcela pouco significativa. Esses ingênuos acreditam que, quem não elegeu Haddad, considera que a corrupção acabará no Brasil em 2019, que todo o governo está imune à erros, que todos os problemas do Brasil serão resolvidos como mágica, que todas as decisões do governo serão acertadas, e por ai vai.

Bolsonaro é hoje o seu e o meu presidente! Simbolicamente é, portanto, meu funcionário, nada mais. Ele é seu funcionário também. Por mais respeito que eu possa ter pelo cargo, dentro do meu respeito ao estado democrático de direito, Bolsonaro é apenas um cidadão ocupando esse cargo, e espero que faça um bom uso dele.

Tive, durante muito tempo, um funcionário que, na minha visão, fez inúmeras cagadas no cargo (incluindo todo o histórico do PT na figura desse funcionário), substituindo outros funcionários que também não me agradaram muito. Num balanço geral, todos foram uma porcaria. Já era certo que eu precisava substituir, o quanto antes, esse funcionário. Ano passado, surgiu um candidato ao cargo que também não era nenhum ideal de perfeição, longe disso, mas se aproximava, bem mais que o outro, do que eu esperava de um funcionário para esse cargo, e se mostrou capaz de demitir o funcionário anterior, com toda a porcaria que representava.

Bolsonaro assumiu esse cargo, ganhou a vaga. Espero que seja um funcionário bem melhor que os anteriores, o que nem exige muito. Se for outra merda de funcionário, quero que se dane o Bolsonaro! Vou esperar encontrar outro melhor e substituí-lo, o mais rápido possível. Que venha outro e bola pra frente, o tempo anda! Em que mundo isso significaria arrepender-se de ter trocado de funcionário ou desejar trazer a porcaria do funcionário anterior de volta? Ou buscar botar no cargo alguém que meu funcionário anterior, que não tem nada da minha confiança, indicar ou demonstrar semelhanças? Jamais!

Então, espero que todos os lados consigam dialogar com serenidade, visão critica, autocrítica e menos passividade por partidos, políticos e vertentes. Mas que sempre exista divergência, confrontos de ideias e respeito, pelo menos com quem não seja de fato um filho da puta, algo que existe em qualquer campo politico, em qualquer campo da existência humana. Por fim, desejo que ninguém se porte como religioso politico, e desejo boas vindas aos opositores de Bolsonaro!

Renan Portela é articulista e se responsabiliza por todo o material escrito. Sua opinião não expressa necessariamente a opinião do Jornal

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