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Não Somos Todos Iguais! Por Karoline Miranda

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POR KAROLINE MIRANDA

Hoje é o dia em que toda a sociedade lembra que a gente existe – venhamos e convenhamos, porque é feriado. Sabe aquele dia em que ninguém trabalha, e não sabe por quê? Aí correm pra saber porque é feriado. 20 de novembro, dia da Consciência Negra.

Em meus 22 anos de vida, já vi as pessoas lidarem com esse dia de várias formas diferentes. Algumas pessoas endeusam a cultura negra, enfatizando a miscigenação dos povos e a “mistura de raças”, pois #somostodosnegros. Algumas acham ele um dia sectário, porque como somos todos iguais sem distinção e diferenciação e essa data só aumenta o preconceito, deveria ser dia da consciência humana. Algumas simplesmente não ligam, quanto menos dia pra trabalhar, melhor. Entretanto, poucas pensam essa data como um momento para exercitar o que o dia realmente indica: a consciência.

Quando sento ao computador para escrever sobre o Dia da Consciência Negra, não escrevo sozinha. Minha mão, pesada, leva a carga não somente de séculos de escravidão e subjugação ao europeu, mas de uma cultura ancestral milenar. Sinto o peso da enxada não somente do escravo Damião, que perdeu seu nome em um dos navios negreiros, mas também da espada de Tchaka, fundador do Império Zulu africano. Carrega Zumbi, Dandara, Anastácia, Ganga Zumba e tantos outros que fizeram de sua cor, sua resistência, e que a história escrita pelo branco fez questão de apagar.

20 de novembro não é dia de postar foto com o amigo preto falando que você não é racista. Não é dia de falar que somos todos negros – porque não somos. Não é dia de dizer que você não é racista, porque até tem amigos negros. É dia de autocrítica.

É dia de se perguntar: quantos professores negros você já teve? Quantos chefes negros você já teve? Quantas atrizes negras você conhece? Quantas pessoas ricas e negras você conhece?

É dia de se perguntar porque quando uma criança branca corre na rua é pique pega, quando uma criança negra corre é arrastão. Se perguntar por que a sua diarista, a babá da filha da sua amiga, a auxiliar de limpeza do seu trabalho, o gari, o motoboy são negros e você acha isso normal sim, porque sempre foi assim. Se perguntar porque preta, quando vira atriz, só faz papel de doméstica ou de escrava em novela de época. De se perguntar por que educação religiosa na escola é sobre o amor de Jesus, mas ninguém menciona quem pode ser Oxalá, Xangô ou Oxum. Por que cantar gospel no ônibus é fé, cantar ponto de Exu Caveira é macumba. De se perguntar por que se somos todos iguais, a maioria dos estudantes de escola pública são negros. De pensar quantos alunos negros você vê na sala de aula do cursinho pré-vestibular mais caro da sua cidade, e repensar porque existem cotas raciais.

São tempos críticos para nós, como sempre foi. O racismo não deixou de existir – e não vai deixar de existir se a gente não falar dele, me perdoe, Morgan Freeman. Zumbi tombou pela libertação de seu povo. Palmares tombou. Hoje tomba o menino negro que anda com um saquinho de pipoca e é confundido com bandido. Hoje tomba a menina negra que não tinha condições de pagar aborto clandestino em clínica na Zona Sul e morreu na carnificina da favela. Hoje tomba a favela. Tomba Amarildo, Cláudia, Rafael Braga. Tombamos todos os dias, numa guerra travada contra um sistema onde preto e preta só serve se for pra ser faxineiro e cozinheira.

Por isso, dia 20 de novembro é mais do que um dia de Consciência Negra – é dia de Resistência Negra. É dia de lembrar que o preto tem história, que a África é um continente milenar, que a gente tem cultura, tem força e tem cor, sim. Que o branco não é padrão de beleza pra ninguém. Que o cabelo crespo é lindo, o turbante é lindo. Que resistimos.
E que se hoje somos Amarildo e Cláudia, resistimos na força de Aqualtune e Ganga Zumba.
Todo poder ao povo preto!

KAROLINE MIRANDA  TEM 22 ANOS. É FEMINISTA, UMBANDISTA, MILITANTE POLÍTICA E ESCREVE NO SEU BLOG “UMA MÃE FEMINISTA”

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