A arte de incomodar

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Renan Portela

Acho muito curiosa uma mania que já venho observando a algum tempo, que é a mania de tratar o incômodo como algo que valida a qualidade de alguma coisa. Isso é muito comum. Tenho certeza que todos vocês já ouviram alguém dizer “Aaah, mas se você ta criticando isso é porque ta te incomodando né?”, e com certo ar de “te peguei” que só falta balançar as mãos no alto (as vezes nem isso falta).

Porra cara pálida, é óbvio que você critica algo que te incomoda, já pensou alguém dizendo “aaaaaah, ta criticando o nazismo é porque o nazismo incomoda né???”… Fica uma coisa como se o incômodo necessariamente fizesse algo ser incrível.

“Se te incomoda te faz repensar as coisas”, não fode! Pegar van lotada me incomoda e a única coisa que eu penso é se vale a pena pagar e descer no próximo ponto e ter que pagar outra para chegar no meu destino. Ver cachorros brincando não me incomodam em nada e me fazem refletir mais sobre a vida do que calcinhas com menstruação penduradas na USP.

Isso acontece muito na arte, fica um tipo de retórica que impede a validação de qualquer critica sobre o assunto. A pessoa nunca pensa “isso realmente pode ser uma merda”, porque para ela basta justificar que é bom. Ou seja, ou você gosta da arte apresentada porque ela é boa, ou ela também é boa porque te incomodou e você ta criticando por isso e sem saber de nada. Desde quando incômodo virou padrão de qualidade? Fica uma defesa ridicula de qualquer coisa como se incomodar alguém fosse o papel a se cumprir. Estamos perdendo a opção de simplesmente poder considerar algo ridiculo.

Fazem a mesma coisa com coisas como cultura, você também já ouviu que “você não pode criticar isso porque isso é a cultura deles”, como se você não pudesse achar que essa “cultura deles” é uma cultura de merda.

Sabe quando criança começa a fazer birra querendo atenção? Até o velho “incomodado que se mude” era mais honesto do que isso, porque pelo menos você podia se mudar sem ser classificado como alguém que se não gostou de alguma coisa é porque não entendeu as “maravilhas inquestionáveis da arte de incomodar”!

Renan Portela é estudante de psicologia, apaixonado por politica, esporte (Flamengo) e música, e escrever é a terceira coisa que mais gosta de fazer. Colunista semanal do Blog do Léo

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