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“Resistência” é o enredo do Salgueiro para o próximo carnaval

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A Acadêmicos do Salgueiro resolveu apostar em em uma temática afro para o próximo Carnaval. Na noite desta quarta-feira (8), a vermelha e branca anunciou ‘Resistência’ como seu enredo do próximo desfile.

O anúncio do enredo ocorreu em uma live no canal do YouTube da escola, que reuniu, além de Alex e Helena, a assessora de imprensa Joice Hurtado, que conduziu a conversa com os artistas e apresentou o tema e a logo. O anúncio do enredo já vinha se desenrolando nos últimos dias com ações promocionais nas redes sociais da escola.

Com o luxuoso auxílio da Dra. Helena Theodoro, o trabalho idealizado em conjunto pelo carnavalesco Alex de Souza – que assinará seu quarto projeto na agremiação – e o Departamento Cultural, trouxeram à tona um tema cuja identificação com a escola é total.

“ O Salgueiro é pioneiro em revelar a questão preta no Brasil e, alçar ao seu devido lugar de destaque, personagens da nossa história. Desta vez, estamos juntos, eu e o Cultural, para realizar este trabalho que tem a chancela da Helena, uma mulher preta, escritora, ativista e salgueirense. Estamos felizes com a contribuição dela neste projeto que nasceu dentro de um espectro de luta, afinal, vivemos um momento de transformação do mundo e das pessoas”, diz Alex.

Escrita por Paulo Barros, diretor de comunicação da agremiação, com a contribuição valorosa da pesquisa do departamento cultural, “RESISTÊNCIA” é um enredo focado no Rio de Janeiro, e que traz consigo, todas as formas que o povo teve para resistir e preservar sua cultura, sua fé, sua voz e sua sobrevivência.

“ Apesar da minha experiência com o Carnaval, de todos os meus estudos e da minha vivência, trabalhar para a minha escola é realmente emocionante. Alex está sendo muito generoso comigo”, comentou Helena, coautora do enredo durante a live.

Nos próximos dias, serão divulgados o calendário e o formato da disputa de sambas da escola. Os produtos com o tema do enredo já podem ser adquiridos nos canais oficiais da escola.

 

Confira aqui a sinopse

Enredo: ‘Resistência’
Maior cidade escravista das Américas, o Rio de Janeiro foi o palco da assinatura da Lei Áurea, diploma legal que extinguiu a escravidão no Brasil. Abolir o trabalho escravo, porém, não foi suficiente para promover as mudanças tão desejadas por todos nós. Abandonados pelo Império, continuamos sem condições para uma existência decente. Libertos, tornamo-nos prisioneiros da miséria nos cortiços, nas ruas, nos trabalhos precários e na ausência de direitos humanos e sociais básicos. Discriminados e marginalizados, sem cidadania, sem alternativas para uma vida digna, fomos lançados à nossa própria sorte. Excluídos – no dia seguinte, na década seguinte, no século seguinte –, vivemos, até hoje, sufocados.

Hoje, ser preto no Rio de Janeiro e no Brasil (país que tem a segunda maior população preta no mundo) é ter que lutar diariamente por respeito. Lutar para não ceder nem sucumbir à segregação promovida pela sociedade e pelo Estado. É recusar os abusos e a submissão pela ausência de políticas públicas que poderiam promover melhores condições de vida. É não se deixar enganar pela pseudo “democracia racial”, sempre camuflada por hipocrisia, eufemismos ou subterfúgios mal disfarçados.

Aqui, ser preto é, acima de tudo, um ato de RESISTÊNCIA.

E resistir é ter nossa história, antes negada e silenciada, ressignificada e recontada no carnaval, lugar de alegria, mas também de diálogo com o mundo. Ao som dos tambores ancestrais, o Salgueiro foi pioneiro na introdução da temática africana nas escolas de samba. Seguiu na contramão da narrativa “oficial” do país e deu vez e voz aos personagens, heróis e protagonistas pretos. Como um Griot, transmitiu ricas histórias por meio de enredos que revelam a participação da escola no processo de resistência cultural e de luta contra o racismo institucional.

Resistir é plantar um legado nos “chãos” do Rio de Janeiro. Criamos Quilombos, lugares de resistência e insurgência negra, com estrutura politica, econômica e social africana. Revivemos a história nas marcas deixadas na Pequena África, região que se destaca como lugar de acolhimento e também por personagens como as tias baianas festeiras da Praça XI, cozinheiras e Mães de Santo celebradas até hoje pela fantasia e pelo rodopio que as nossas Alas de Baianas exibem. Foram elas que formaram o espaço sociocultural do samba, entendido como extensão dos terreiros de Candomblé.

Resistir é professar nossa fé. Por ela nos unimos nas irmandades religiosas que faziam filantropia por justiça social. Construímos os terreiros de Candomblé, templos que são uma reinvenção do macro universo cultural e religioso trazido do continente africano. Desenvolvemos o Culto Omolokô e criamos a Umbanda, religião afro-brasileira surgida no Rio de Janeiro, que sincretiza elementos do Candomblé, do Espiritismo e do Catolicismo.

Resistir é expressar nossa cultura para manter a continuidade de valores civilizatórios. Com a benção dos orixás, entramos na cozinha, espaço de saber, para alimentar o corpo e a alma. Para transformar alimentos, hábitos e a própria culinária brasileira. Ao som dos atabaques, “compramos o jogo” nas rodas de capoeira e dançamos jongo ou caxambu. Pisamos nos gramados para expulsar os cabelos esticados e o pó-de-arroz que “disfarçavam” a cor da nossa pele. Brilhamos nas passarelas e nas ruas com as formas, símbolos, cores e texturas de nossa moda.

Resistir é fazer arte. Inquietos por representatividade e pela visibilidade que insistem em nos sonegar, criamos nossas próprias narrativas e espaços nas artes cênicas, como o Teatro Experimental do Negro. Assumimos nosso protagonismo e nos fizemos enxergar também por meio da literatura, da dança, das artes plásticas. Espalhamos para o mundo a vocação artística que reside em nós.

Resistir é festejar. É revelar nossa maneira de ser por meio das festas, do modo de celebrar a vida, do entusiasmo que propicia o resgate de nossa identidade e afirmação existencial. Desde o chorinho na Festa da Penha, passando pelas escolas de samba, afoxés e blocos afro. Pelo pagode à sombra da tamarineira, pelo funk carioca e pelo charmoso baile sob o viaduto de Madureira.

Resistir é existir.
É continuar a reverberar a coragem dos nossos heróis contemporâneos de pele preta.
É saber que somos frutos de uma mesma raiz de igualdade, fé, esperança, arte e vida.
É crer que nenhuma luta foi em vão. Que nenhuma luta será em vão.
É persistir no sonho de igualdade para que ele não seja silenciado.
É entender que, juntos, em cada passo e em cada pequena mudança, seguiremos adiante.
E é ter certeza que no dia em que fizermos cair todas as máscaras da discriminação, conseguiremos, enfim, respirar.

Autoria e curadoria: Dra. Helena Theodoro
Carnavalesco: Alex de Souza
Concepção: Eduardo Pinto e Marcelo Pires (Diretoria Cultural)
Texto: Paulo Barros

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