sábado, maio 18, 2024

É arte ou não é arte? Pouco importa!

BLOG DO LEOÉ arte ou não é arte? Pouco importa!

Algo ser chamado de “arte” não significa que é uma boa arte para seu apreciador ou que deva ser inicialmente considerada como tal, muito menos que deva ser aceita por todos sem o minimo de critério só porque é arte. Não importa quem é o artista e sua autoridade na área, não importa seu tempo na profissão, seus adoradores, a opinião de especialistas sobre as suas obras, isso serve pra qualquer um. 

Tacar bosta de um prédio na cabeça de alguém pode ser para o artista, e para mais alguns entusiastas, uma manifestação artística, o que não significa que o cara que levou a rajada na cabeça e as demais pessoas devam aplaudir, sequer que possuem obrigação de refletir profundamente sobre a bosta ou entender as “intenções” do artista, por mais que o artista as julgue nobres. Pouco importa se quem tacou a bosta foi a Pablo Vittar ou a Marina Abramović. 

Da mesma forma pichar a fachada da casa de alguém pode ser considerado uma bela manifestação artística por muitos (vai entender!!!), o que não retira o direito de se manifestar da população e do morador afetado em defesa de suas propriedades. Uma pessoa não é fascista porque não quer que um idiota qualquer danifique o que é seu. O que vocês querem? Querem que qualquer coisa que se chama “arte” seja tratada como uma manifestação que não deve desencadear nenhuma manifestação contrária? A ação artística deve ser imune a qualquer reação? Artistas se tornaram, de maneira contraditória com as pautas atuais, como religiosos fanáticos?

Digamos que eu queira chamar esse meu texto de arte, beleza? Aqui estou expressando um recorte de como vejo o mundo através da habilidade da escrita e blá-blá-blá. Você é dono de todo direito do mundo, como individuo livre que deveria ser, para julgar que estou falando um monte de porcarias nesse texto, que escrevo mal, que a leitura é cansativa, que não é adequada para todos os públicos, que não sabe como passei no ENEM desse jeito, etc. Você poderia escrever uma resposta, poderia me excluir da sua lista de amizades, poderia recomendar que as pessoas se afastassem de mim, e se eu dissesse algo que para você é inaceitável, poderia denunciar-me. Acredite, eu não iria me defender dizendo que você é um completo ignorante em relação a minha arte e que deveria ficar calado ou passar batido. 

A questão do “público ignorante” também é muito relevante nessa discussão. No Brasil estamos recheados de artistas que posam como grandes sábios evoluídos em relação a cultura e menosprezam as “grandes massas bestializadas”. Por exemplo, quando reclamam da falta de interesse do público por Teatro, enquanto estão presos em suas performances pseudo-Cult em que a necessidade de transmitir ideias politicas ou “chocar” é mais relevante que o entretenimento em si. A palavra “entretenimento” assusta boa parte da classe artística que se julga acima das coisas mundanas, diriam que me falta “sensibilidade artística” talvez? As vezes penso no processo de criação em que alguém diz “olha pessoal, se ninguém aparecer pelado vai ser um desperdício, afinal pepeca, rola e teta é que vai elevar nosso patamar, temos necessidade disso”. 

Lembrando que é muito importante criticar a falta de interesse do público em geral ao mesmo tempo que se critica os musicais da Broadway, que aliás estão sempre lotados. Maldito público que lota o teatro pra assistir a nova do Miguel Falabella pagando 100 reais, mas não lota o Centro Cultural pra assistir a poética peça sobre o declínio do capital enquanto o ator se rasteja como uma minhoca no palco pra representar a isca que será usada pelas grandes corporações pagando 5 reais, não é? Por que será? Não significa que a maioria dos artistas sejam assim, muito menos que grande parte do público não seja de fato ignorante aos meus olhos, mas é importante salientar que nem sempre o que você pensa é o que move o interesse dos outros. 

Se algo é arte ou não é, precisamos cuidar para não cairmos em algo como a falácia naturalista. Muitas pessoas justificam comportamentos alegando que tal comportamento é natural, da mesma forma que muitos justificam qualquer coisa alegando ser arte. Descartamos ou evitamos inúmeros comportamentos que poderiam ser chamados de “naturais” simplesmente pelo fato de que vivemos em sociedade e precisamos zelar por um bom convívio. 

O direito que você e seu grupo possuem de criticar e boicotar os shows de Stand-up do Danilo Gentili, por exemplo, não considerando que o comediante seja uma boa influência para seus filhos inclusive, porque o consideram isso, isso e aquilo, buscando censurar suas piadas por considera-las ofensivas, é o mesmo direito de outras pessoas referente a coisas que vocês consideram aceitáveis. Vocês podem boicotar qualquer coisa, mas ta vendo como não  é muito legal tentar censurar piadas, palavras, turbantes, comerciais e qualquer outra coisa que vocês consideram que a partir dos seus critérios faria do mundo um lugar mais belo, né? 

Assim como você não pode dizer que está sendo censurado buscando censurar reações contrárias as suas ações, porque é bem contraditório.

Esse mesmo direito que é seu, é também o das pessoas que decidiram criticar e boicotar a  exposição “Queermuseu” no Santander Cultural, que interpretaram de maneira ofensiva as obras que lá estavam (mesmo que a interpretação ao seu ver seja equivocada), que julgaram essas obras de péssimo gosto, que ficaram indignadas com a exposição sendo incluída na agenda cultural da escola de seus filhos pequenos, que se revoltaram com o investimento captado via lei de incentivo através de renuncia fiscal, de cancelarem suas contas no Santander como forma de protesto, etc. 

Eu não consigo defender a postura prepotente da exposição em praticamente EXIGIR não ser criticada, assim como defendo todo o direito do Santander de cancelar a exposição por perder clientes e danificar sua imagem como instituição. Pouco importa dentro de todo esse contexto aqui  se é arte ou se atacaram obras da genial Lygia Clark. E olha que nem vou me alongar (ainda mais) falando sobre modelos de financiamento e sobre a questão escolar. 

Defendo que todos esses artistas tenham o direito de produzir e expor essas obras por mais que eu as possa julgar como merdas, que ao mesmo tempo qualquer um possa criticá-las e boicota-las, e que só quem realmente tenha interesse despertado por elas é que vá procurá-las. 

Aos responsáveis pelo “Queermuseu”, sejam inteligentes e aproveitem a divulgação midiática da exposição de vocês. Aluguem ou arrumem um espaço privado com dinheiro de vocês, talvez até arrumar um patrocínio direto de alguma empresa sem precisar de lei de incentivo pra isso, cobrem entradas, e deixem que as famílias que se interessarem por livre vontade visitem a exposição de vocês, mesmo que seja só pra dizer se é arte ou não é!
Abraços!

Imagem: Obra da artista Bia Leite.

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