quinta-feira, maio 9, 2024

Lojas Arapuã – O início, o bilhão e a agonia perto da falência

BLOG DO LEOLojas Arapuã - O início, o bilhão e a agonia perto da falência

Leonardo Oliveira

Hoje o Blog começa uma nova série de reportagens sobre empresas que tiveram o seu auge nas décadas de 70,80 ou 90 mas que faliram ou que não possuem hoje o mesmo resultado.

Hoje vamos começar falando de uma empresa que todo mundo que tem mais de vinte e cinco anos de idade deve conhecer ou pelo menos lembrar de seu jingle: Arapuã – ligadona em você

A Arapuã foi uma loja de venda de eletrodomésticos, uma das maiores do mercado. Foi a principal loja do país a frente de Casas Bahia e Lojas Americanas por exemplo por um tempo. Seu maior lucro foi de 2,2 bilhões em 1996 por exemplo.

Como essa empresa, esse império que parecia infalível quebrou?

O que aconteceu com as pessoas que fizeram isso com a empresa?

É isso que vamos saber agora.

Início com Loja de Tecidos

Tudo começou em 1957 quando Jorge Wilson Simeira Jacob, ainda menor de idade herdou do pai a Loja de Tecidos Nossa Senhora Aparecida, na cidade de Lins no interior de São Paulo.

O Pai havia deixado a loja endividada, quase a falência também. Mas Jorge encontrou uma solução. Depois de receber a visita de um advogado para comunicar o pedido de falência da empresa, passou a noite em claro mas levantou com a solução. Procurou o juiz e ofereceu o pagamento de 50% das suas dívidas. Com o aval dos credores, o juiz desbloqueou a conta bancária do menor. Equacionada a questão, Jacob começou a tocar a loja dando início a expansão que veio em 1957 com a segunda loja no Lins, seguida de outra fora da cidade. Foi quando percebeu a necessidade de mudar a razão social da empresa e o ramo dela. Nascia ali as Lojas Arapuã

A partir daí veio a expansão, crescimento. Na década de 80 chegou a faturar mais de 700 milhões de dólares e os lucros apareciam nos balancetes da empresa. A Arapuã já era a líder em vendas de móveis e eletrodomésticos, numa época em que o Brasil vivia em tempos de hiperinflação do Governo Sarney.

A princípio nada deveria mudar, mas Jacob tomou uma decisão ousada.

Após uma viagem aos Estados Unidos para conhecer as grandes redes varejistas do país como Radio Shack, Best Buy e a Circuit City, donas de faturamentos de cerca de 7 bilhões de dólares por ano.

A decisão foi ousada e arriscada. De cara fechou 120 lojas e reduziu a linha de produtos de 7500 para 700 itens. Tapetes e cristais deixaram de ser vendidos, concentrando apenas nos eletroeletrônicos. 

Resultado: em três anos o faturamento caiu de 800 mi para 430 milhões de dólares. O mercado não entendeu nada.

A ousadia estava certa na lógica que se passava. A especialização em uma modalidade trouxe um poder de compra maior.

A Arapuã desde o início da década de 90 informatizou seu sistema, investindo mais de 100 milhões de dólares. O giro dos estoques, quando todos os produtos são trocados após as vendas caiu de 90 para 20 dias enquanto concorrentes como Casas Bahia girava em 45 dias.

No trabalho em si estabeleceu metas, bônus e remunerações variáveis.

Os resultados voltaram a aparecer.

Em Outubro de 1995 a Arapuã entrou no mercado de capital aberto.

Em 1996 veio o auge. Um faturamento de mais de 2,2 bilhões de reais. Crescimento de mais de 50% sobre o ano de 1995.

Lucro líquido de 119 milhões de reais, 250% a mais que em 1995. Redes norte-americanas como Circuit City e Radio Shack lucraram cerca de 2% sobre as vendas. A Arapuã 6,8%.

Em 15 meses houve uma valorização de 140% na bolsa de valores.

A participação nas vendas nacionais de eletroeletrônicos subiu de 11 para 16%.

Em 1997 uma matéria da revista Exame celebrava esse momento da Arapuã enquanto as concorrentes enfrentavam dificuldades.

Lojas Arapuã – Contra a corrente

Como explicar uma reviravolta tão profunda em tão pouco tempo? Como uma empresa que é considerada a melhor do setor varejista no ano de 1996 pede concordata em 1998?

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Foto: Paulo Rubens Fonseca/O Globo

Pode ser explicado por erros estratégicos da empresa, somada a crise financeira internacional provocada pela crise do mercado asiático em 1997.
O Brasil foi um dos países que sofreu com essa crise, tendo um aumento no desemprego por exemplo.

A Arapuã pecou justamente numa estratégia em que foi a pioneira no Brasil. O crédito ao consumidor.

Foi a primeira varejista a dar crédito aos clientes comprarem a prazo ainda nos anos 60.

Só que em 1997 esse foi um dos fatores que representaram um prejuízo de 168 milhões a empresa.

Não por dar crédito, mas por não estabelecer determinados critérios. A inadimplência no país explodiu, também devido a grande crise do mercado asiático, semelhante a recessão que o Brasil enfrenta hoje.

Com a inadimplência em alta, a Arapuã que oferecia pagamento a prazo não resistiu.

Diferentemente de concorrentes como Casas Bahia e Ponto Frio que só cresceram.

LEIA ESSE TRECHO DA GAZETA MERCANTIL DE 6 DE ABRIL DE 1998, REFERENTE AO BALANÇO DA EMPRESA EM MARÇO DO MESMO ANO.

“O mercado – Após o rápido crescimento verificado no setor de eletrodomésticos, em 1996, o mercado iniciou este exercício prevendo a manutenção das altas taxas de
crescimento. A indústria de bens de consumo duráveis preparou-se e produziu não só para atender a uma demanda crescente, como também para enfrentar a ameaça da concorrência externa; o varejo se estruturou a fim de lidar com um volume de vendas ainda maior. A indústria da linha marrom, por exemplo, que fabricou 8 milhões de aparelhos de TV em 1996, projetou, para o ano de 1997, produção de 12 milhões de aparelhos, para um mercado que de fato absorveu menos de 8 milhões.

As conseqüências desse crescimento do setor sobre a balança comercial impuseram a
necessidade de se conter a demanda, principalmente nas vendas a crédito. Desta forma, o IOF – Imposto sobre Operações Financeiras foi elevado de 6% para 15%, impactando
fortemente o custo final do crediário.

Do lado do consumidor, a população de baixa renda foi atingida pelo desemprego, ou por
sua ameaça, e pelo aumento do tempo necessário para se recolocar no mercado de trabalho.

Segundo pesquisa da Associação Comercial de São Paulo, para 62% dos entrevistados, o
tempo necessário entre a saída de um emprego e sua recolocação aumentou, ultrapassando 10 meses. Em virtude de o desemprego corresponder a mais de 40% dos casos de inadimplência o ciclo de recuperação de créditos vencidos estendeu-se
consideravelmente em 1997.

A conjugação destes fatores repercutiu de forma negativa sobre os negócios da Companhia.

A administração da Lojas Arapuã utilizou uma estratégia muito comum entre os
especuladores financeiros: crescimento baseado em endividamento. Neste caso, o
endividamento era dos seus clientes através das compras financiadas.
Acreditando que os bons tempos chegaram para ficar, a empresa começou a financiar os
seus clientes com recursos próprios, esquecendo que esta não era a sua vocação como
empresa do setor de varejo, permitindo que as vendas a prazo chegassem a 75% do
faturamento total.

Essa estratégia parece perfeita em épocas de expansão econômica, porém perde a
sustentação em épocas de crise, pois, com a redução da capacidade de pagamento dos
clientes, não só estes deixam de fazer novas compras financiadas, reduzindo as vendas
futuras, como deixam de pagar as compras feitas no passado, corroendo assim o capital de giro da empresa e o seu volume de vendas, deixando-a sem condições de repor o seu
estoque para continuar suas atividades.

Qual seria a estratégia mais segura? Terceirizar o financiamento aos clientes que quisessem comprar a prazo. As financeiras, como são conhecidas as empresas de crédito ao consumidor, vivem deste negócio e conhecem os riscos envolvidos. Não há razão, portanto, para que uma empresa de varejo corra um risco inerente ao setor financeiro.”

A QUEDA DO IMPÉRIO DOS SIMEIRA JACOB

Logo em 1998 a Arapuã pediu concordata. Suas dívidas já somavam 1 bilhão de reais.
O débito com os credores foi dividido em duas parcelas mas nenhuma foi paga. O processo de reestruturação a dividiu em duas: Arapuã Comercial ( Lojas e Administrativo) e Arapuã S/A (passivo).

Os credores contestaram os planos de recuperação judicial da Arapuã. Entre os credores a Philips e a Evadin (Fabricante da Mitsubishi) que pediram a falência da empresa várias vezes.

Em 2001, Jorge, Renato e Antônio Carlos Jacob foram condenados a quatro anos de prisão por crime de colarinho branco em regime aberto já que usaram o Banco Fenícia para emprestar dinheiro para a Arapuã, o que a lei proíbe já que são dos mesmo grupo. O que poderia configurar lavagem de dinheiro.

Recorreram e nunca cumpriram a pena.

Além da Arapuã ainda tinham o Banco Fenícia, que era a financiadora de créditos da Arapuã, a Construtora Lótus, a fabricante de alimentos Etti, (Que foi patrocinadora do clube Etti Jundiaí, hoje Paulista de Jundiaí) que foi vendida para a Parmalat Italiana e a fabricante de chocolates Negeubauer, vendida pelo valor de sua dívida.

Em Agosto de 2002 foi decretada falência mas foi suspensa por uma liminar em 24 horas assim como em 2009.

A partir de 1998 começou o derradeiro encerramento de lojas em todo o país

Veja nessa matéria da Folha de São Paulo em 22 de Junho de 2002

41 lojas foram fechadas em todo o país antes em 1999

Mais de 100 lojas fechadas em 2002, por determinação da justiça


Matéria da Época Negócios em 2010

As brigas judiciais se arrastam até hoje.

Com a Arapuã querendo pagar suas dívidas e não conseguindo e os credores querendo recuperar o calote mas não recebendo tendo em vista que a falência facilitaria o pagamento.

Em 2009 a Arapuã mudou de ramo. Passou a vender roupas a preços mais baratos na periferia de São Paulo e de Belo Horizonte

A família Jacob que parte vive em Miami ainda é controladora da empresa

Hoje a Arapuã ainda possui dez lojas de vestuário em São Paulo e Belo Horizonte e ainda se encontra em recuperação judicial.

Sua dívida atualizada chega a 8 bilhões de reais.
A dívida original chega a 500 milhões de débito tributário, 25,6 milhões a ex-funcionários que ganharam na justiça o direito a indenizações.

A Arapuã chegou a oferecer 3,5 milhões a investidores e empresas. Valor bem abaixo da dívida de 694,5 milhões com os mesmos.

Em 2015 sofreu um duro golpe. O nome Arapuã precisou ser trocado para Kosmos Comércio de Vestuário mas o CNPJ foi mantido. O nome Arapuã deve ser leiloado para pagar uma parte da dívida mas ainda não há propostas.

Renato Simeira Jacob, herdeiro ainda toca a empresa mas seu último investimento foi numa companhia de bebidas, a Beba Rio.

Novo investimento do herdeiro da Arapuã


MEMÓRIA AFETIVA 

A Arapuã fora toda essa questão sempre foi uma empresa que marcou pelas suas campanhas promocionais, pelos jingles, pelas suas propagandas. Pelo charme que tinha.
Marcou a vida de todos que viveram a década de 80 e 90.

Certamente tinha uma Loja Arapuã perto da sua casa.

A história ainda não foi encerrada. Em algum momento, mesmo que seja extremamente difícil, a Arapuã ainda pode se recuperar, pagar suas dívidas e voltar. O ideal é que pague logo seus credores. Isso não esconde a incompetência de seus gestores.

Perdeu o país com mais uma empresa fechada. Menos investimentos e geração de empregos

A década de 90 é uma década em que várias empresas se não faliram, pediram concordata.

A crise afetou a vários segmentos empresariais.

A Arapuã fica na nossa mente pelo que é de mais charmoso.

Hoje a Kosmos é um fiapo. Não é nem sombra da empresa que faturou 2,2 bi num ano e que foi pioneira do crédito ao consumidor.

O que fica é a lembrança. Relembre essas propagandas antigas

https://www.youtube.com/watch?v=Q2K-FNdM9G8

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